É preciso correr, adverte a
ciência ( ECO) / FC # 20 )
Washington Novaes *
Deveria ser leitura
obrigatória para todos os governantes, de todos os níveis, todos os lugares, o
documento de 22 páginas entregue em 20 de fevereiro/2012, em Nairóbi, no
Quênia, aos ministros reunidos pelo Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente, inscrito e assinado por 20 dos mais destacados cientistas que já
receberam o Prêmio Blue Planet, também chamado de Prêmios Nobel do Meio Ambiente.
Entre eles estão a ex- primeira - ministra norueguesa Gro Brundtland,
coordenadora do primeiro relatório da ONU sobre desenvolvimento sustentável;
James Lovelock, autor da “Teoria Gaia”; o professor José Goldemberg,
ex-ministro brasileiro do Meio Ambiente; Sir Nicholas Stern, ex- economista – chefe do Banco Mundial , consultor
do governo britânico sobre clima; James Hansen, do Instituto Goddard de Estudos
Espaciais (Nasa) ; Bob Watson, conselheiro do governo britânico ; Paul Ehrlich,
da Universidade Stanford; Julia Marton - Lefevre, da União internacional para a
Conservação da Natureza; Will Turner, da Conservação Internacional – e vários
outros.
Nesse documento os cientistas traçam, com
palavras sóbrias e cuidadosas, um panorama dramático da situação do mundo,
hoje, em áreas vitais: Clima; excesso de consumo e desperdício; fome;
necessidade de aumentar a produção de alimentos e escassez de terras;
desertificação e erosão; perda da biodiversidade e de outros recursos naturais;
subsídios gigantescos nas áreas de transportes, energia, agricultura – e a
necessidade de eliminá-los. Enfatizam a necessidade de “empoderamento” das
mulheres e de grupos sociais marginalizados: substituir o produto interno bruto
(PIB) como medida de riqueza e definir métodos que atribuam valor ao capital
natural, humano e social, atribuir valor à biodiversidade e aos serviços dos
ecossistemas e deles fazer a base da “economia verde”.
É um documento que, a
cada parágrafo, provoca sustos e inquietações, ao traçar o panorama dramático
que já vivemos em cada área e levar todo leitor a perguntar qual será, o futuro de seus filhos e netos. “O atual
sistema ( no mundo) está falido” , diz Bob Watson. “Esta conduzindo a
humanidade para um futuro que é de 3 a 5 graus Celsius mais quente do que já
tivemos; e está eliminando o ambiente natural, do qual dependem nossa saúde,
riqueza e consciência. (...) Não podemos presumir que a tecnologia virá a tempo
para resolver; ao contrário,
precisaremos de soluções humanas”.
“Temos um sonho”, afirma o documento. “De um
mundo sem pobreza e equitativo – um
mundo que respeite o direitos humanos – um mundo de comportamento ético mais amplo com relação à
pobreza e aos recursos naturais – um mundo ambientalmente, socialmente e
economicamente sustentável, onde desafios como mudanças climáticas, perda da
biodiversidade e iniquidade social tenham sido enfrentados com êxito. Esse é um
sonho realizável , mas o atual sistema está profundamente ferido e nossos
caminhos atuais não o tornarão realidade”.
Segundo os cientistas, é urgente romper a
relação entre produção e consumo, de um
lado, e destruição ambiental, de outro: “Crescimento material sem limitas num
planeta com recursos naturais finitos e em geral frágeis será insustentável”, ainda mais com subsídios
prejudiciais em áreas como energia (US$ 1 trilhão/ano), transporte e
agricultura – “que deveriam ser eliminados”. A tese do documento é de que os
custos ambientais e sociais deveriam ser internalizados em cada ação humana,
cada projeto. Valores de bem e serviços dos ecossistemas precisam ser levados
em conta na tomada de decisões. É algo
na mesma direção das avaliações recentes de economistas e outros estudiosos,
comentadas neste espaço, a respeito da finitude dos recursos naturais e da
necessidade de recompor a vida econômica e social em função disso.
O balanço na área de
energia é inquietador, com a dependência de combustíveis fósseis, danos para a
saúde e as condições ambientais. Seria preciso proporcionar acesso universal de
toda a população pobre aos formatos “limpos” e renováveis de energia – a transição para economia de ‘baixo carbono” - , assim como a formatos de captura e
sepultamento de gases poluentes ( ainda em avaliação). Como não caminhamos
assim, as emissões de dióxido de carbono equivalente já chegaram a 50 bilhões
de toneladas anuais, com a atmosfera e os oceanos aumentando suas concentrações para 445 partes
por milhão (ppm) – mais 2,5 ppm por ano,
que desenham uma perspectiva de 750 ppm no fim do século. E com isso o aumento da temperatura poderá
chegar a mais 5 graus Celsius.
Na área da
biodiversidade, 15 dos 24 serviços de ecossistemas avaliados pelo Milleniuum
Ecosystem Assessment estão em declínio –
quando é preciso crias caminhos para
atribuir valor à biodiversidade e seus serviços, base para uma “economia verde”
. Mas para isso será preciso ter novos formatos de governanças em todos os
níveis – hoje as avaliações cabem a estruturas políticas, sociais, econômicas,
ambientais, separadas e competindo entre elas.
E para que todo isso
seja possível, dizem os cientistas, se desejamos tornar reais os nossos sonhos,
“o momento é agora” – enfrentando a inércia do sistema socioeconômico e impedindo que sejam irreversíveis as
consequências das mudanças climáticas e de perda da biodiversidade. Se
falharmos, vamos “empobrecer as atuais e às futuras gerações”. Esquecendo que
vivemos em “uma sociedade global infestada pela crença irracional de que a
economia física pode crescer sempre, deslembrada de que os ricos nos países
desenvolvidos e em desenvolvimento se tornam mais ricos e os pobres são
deixados para trás”.
Não se trata de um
manifesto de “ambientalista”, “xiitas” ou hippies. São palavras de dezenas dos
mais conceituados cientistas do
mundo, que advertem: “A demora (em mudar) é perigosa e seria um
erro profundo”.
É preciso ler esse
estudo (www.af-info.or.jp). Escutar. E dar consequências.
*W.
Novaes Jornalista Ambientalista